Procons vão checar ´maquiagens´ de preços

12/01/2012 - Diário de Comércio
Muitos consumidores se queixaram dos descontos oferecidos em algumas ofertas durante a realização do Black Friday, uma ação de vendas inspirada na Black Friday norte-americana, com promessa de preços reduzidos em até 85% em lojas virtuais e físicas. O descontentamento foi tão grande que no mesmo dia da ação, sexta-feira 23/11, um grande número de reclamações foi postado nas redes sociais e alguns consumidores acionaram os órgãos públicos e civis de defesa do consumidor exigindo providências.
Diante da gritaria de clientes frustrados, o Procon-SP agiu rapidamente e notificou grandes redes de lojas virtuais e físicas para prestarem esclarecimentos sobre a promessas de enormes descontos que não foram vistos pelos consumidores. Dependendo da resposta dessas empresas e da conclusão de que houve promessa não cumprida, elas poderão ser autuadas. As multas chegam a R$ 6 milhões.
 
A instituição pública paulista de defesa do consumidor acionou também a organizadora do evento, a Busca Descontos, que havia detectado já nas primeiras horas da manhã que algumas empresas 'maquiaram os descontos' e chegou a bloquear cerca de 500 ofertas do site.
 
Desconto – Com este episódio foi 'inaugurada' nas relações de consumo um novo tipo de 'maquiagem': a do desconto que só existe na propaganda. Até então, falava-se tão somente em maquiagem de quantidade, quando se reduzia o conteúdo das embalagens sem informar o fato ao consumidor.
 
Durante o Black Friday, os consumidores postaram nas redes sociais que as empresas elevaram o preço dos produtos para, então, oferecer o desconto. A conclusão foi com base no monitoramento do preço dos itens que pretendiam adquirir antes da promoção.
 
A Proteste, entidade civil de defesa do consumidor, também monitorou os preços dos produtos durante o Black Friday. Conforme Mari Inês Dolci, diretora da entidade, 'a maioria dos produtos anunciados oferecia um bom desconto, principalmente os eletrônicos. Porém, encontramos métodos questionáveis de promoções nos sites participantes da Black Friday. Muitas chamadas induziram o consumidor a erro e o fizeram acreditar que realmente estava comprando um produto com uma promoção imperdível, mas, na verdade, o valor promocional não era o melhor preço anunciado nos últimos tempos. Alguns produtos foram oferecidos com preços iguais ou até  maiores do que em promoções enviadas pelas próprias lojas durante o mês de novembro por e-mail'.
 
Maquiagem – O termo 'maquiagem' nas relações de consumo é utilizado, aproximadamente, desde 1997, quando o Movimento das Donas de Casas, de Minas Gerais, alertou a imprensa da prática ilegal de empresas de reduzir o conteúdo dos produtos mantendo o mesmo preço. Com a denúncia, os órgãos de defesa dos consumidores foram provocados e o Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC), ligado ao Ministério da Justiça, puniu os 'infratores' com multas. O processo de verificação, entretanto é demorado. Para se ter uma ideia, em 2010 (últimos registros do DPDC sobre o assunto) duas empresas que fabricam chocolates foram multadas em pouco mais de 591 mil cada uma por 'maquiagem de produtos' denunciados em 2004 e 2005. Elas reduziram a quantidade do produto e não informaram ao consumidor. Os processos foram instaurados em 2008.
 
A 'maquiagem de produtos' ocorre sempre que uma empresa altera a quantidade, qualidade, características, preços ou conteúdo do que vende de forma que o consumidor não perceba.
 
Ofertas precisam de acompanhamento
 
As empresas que praticam qualquer tipo de maquiagem estão sujeitas a penalidades, conforme o artigo 39 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), que trata das práticas abusivas nas relações de consumo. No inciso IV, a lei consumerista diz que nenhum fornecedor deve se prevalecer da ignorância ou fraqueza do consumidor. Já o artigo 31, que trata da oferta, determina que a oferta e a apresentação de produtos, serviços e preços devem ser corretas, claras, precisas. 'Quando um produtor faz ajuste de embalagem, ele necessariamente tem de informar ao consumidor, principalmente se a mudança não é perceptível. Se não o fizer, estará sujeito às sanções da lei, uma vez que fere o princípio da boa-fé, da lealdade presentes na lei consumerista. Portanto, se ele fere o CDC, fere também a Constituição Federal que coloca os direitos do consumidor como fundamental', explica Vinicius Zwarg, advogado especializado em relações de consumo, do escritório Emerenciano, Baggio e Associados.
 
Para o advogado, o que ocorreu na ação Black Friday deve servir de aprendizado para todos os fornecedores. 'Como mecanismo de venda, não tem nada de ilegal, é mais uma oportunidade para o varejo como tantas outras datas que movimentam o comércio. Só que ofertar produtos e serviços não é algo tão simples. A oferta precisa estar adequada à luz do direito do consumidor para não haver conflitos tampouco desgastes nesta relação.'
 
A sugestão do dr. Zwarg é que sempre que uma empresa for fazer alguma oferta de produtos ou serviços por meio de um comercial na tevê, de um folheto, de uma página em qualquer revista ou jornal e, até mesmo, numa ação como o Black Friday, se ampare pelo olhar de especialistas em direito do consumidor para que não haja desgastes, autuações, multas, divulgação negativa. 'Adequar as peças publicitárias às determinações do CDC não é algo tão simples. A lei consumerista tem uma série de nuances e há inúmeras jurisprudências que precisam ser analisadas. Ao passar a peça pelo olhar de um especialista evita-se criar passivo com a administração pública.'